sábado, 31 de dezembro de 2011

A última flor do Lácio ou o perigo de se falar português em Paris.

Você já se sentiu, literalmente, na Torre de Babel? Pois se você quer se sentir venha para Paris ou qualquer outra cidade cosmopolita da Europa. Provavelmente, em São Paulo e Rio de Janeiro também deve rolar essa coisa do cosmopolitismo, mas quando vou a SP, por exemplo, frequento a 25 de março, onde só se escuta os comerciantes chineses e coreanos fazendo seus negócios. Aqui não. Em Paris, eu ja devo ter ouvido uma centena de idiomas africanos. É claro que eu não sei diferenciá-los, né? Afinal, mal sei falar francês e  me  muito sinto enganado, pois, quando aqui cheguei, entrei em total desespero ao perceber que não entendia os nomes das estações do RER B. Além disso, ouvir uma mistura de árabe com francês é muito comum e tem também o alemão. Tem também os eslavos. Estranhas as línguas eslavas: ao ouví-las sempre penso que os falantes dessas línguas estão mascando vidro.
Outro dia no RER B - uma experiência antropológica que ainda dividirei com vocês - vi três gerações de mulheres eslavas brigando. Era engraçado demais porque mãe, filha e neta discutiam o tempo todo e muito alto, não se incomodando com os olhares severos dos passageiros. Provavelmente começaram a discussão em Saint Rémy ou qualquer coisa parecida e foram caminho afora discutindo a relação familiar. Para vocês terem uma noção, acompanhei a discussão em 5 estações da Cité Universitaire, onde peguei o trem, até Chatelêt/Les Halles, ponto de mudança de alguns metrôs e RER's e elas não iam parar nunca... Só não pagaram mais mico porque ninguém entendia o que elas falavam.
Falando em entender, é preciso chamar a atenção dos brasileiros para um fato que essas senhoras briguentas não precisaram se preocupar: falar português em Paris pode ser muito perigoso e você pode pagar micos inconfessáveis com essa prática tão normal para nós outros falantes da "última flor do Lácio inculta e bela". Paris está repleta de brasileiros. São turistas e moradores que moram em todos as regiões da cidade. Há também os portugueses. Então, se você estiver em Paris e for falar palavrões e putarias no metrô, cuidado você pode ser flagrado pelo ouvido indiscreto de um falante de nossa querida língua.
Outro dia mesmo, estávamos eu e uma amiga no metro 1 e fizemos alguns comentários não publicáveis em português e uma senhora ao lado perguntou para a filha: "Que língua eles falam?" A menina respondeu: "Português". Automaticamente, quando paramos o papo inconfessável, voltamos a falar francês e ela disse: "Não, eles falam francês!" E a menina: "Eles falam as duas línguas".
Um outro episódio engraçado se deu no metro 5: uma mulher atendeu o telefone e começou a falar alto e em bom português com um cara, provavelmente namorado ou marido. Segue as falas dela:
- Oi, Diego. Ta, Diego, ta tudo bem! Porra, Diego eu ja não falei que eu já resolvi? Diego, assim, me deixa em paz, seu filho de uma puta. Caralho, cara, como você chato, larga do meu pé, já te falei que eu resolvi a porra do negócio, Diego. Caralho, eu vou desligar, vai tomar.... Esta é uma relação baseada na troca afetiva, né gente!
Um outro episódio miquento que só brasileiros sabem fazer com proficiência e cara de pau se deu num outro metrô com uma menina brasileira. Dois caras conversando, enquanto ela de costas ouvia o que eles falavam: "Cara, mas essas francesas são muito sem graça, desbundadas pra caralho!" O outro: "Olha, verdade, mas veja bem essa francesa aí da frente,  gostosa, hein, cara, tem uma bunda boa!". Bom, corta a cena, todo mundo no metrô e 4 estações depois, na descida, a brasileira chega nos rapazes, bem almodovariana e fala: "Obrigado pelo elogio, rapazes!" Nem é preciso ter muita imaginação para ver a cara dos rapazes depois da revelaçaõ, né?
E tem o episódio daquela da menina que estava no Carrefour e viu uma senhora que a encarava. Nervosa ela perguntou para o amigo: "Por que essa mulher está me encarando desse jeito? E ainda fica rindo!" E a mulher responde: "Porque você fala a mesma língua que eu". Claro que rola aquele momento vergonha e todo mundo quer se enterrar e nunca mais sair. Mas isso é pas grave, gente. Todo mundo, no final, acaba ficando espertinho e falando baixinho, como só os franceses podem nos ensinar...
Eu mesmo já foi vítima da sanha assassina de se falar português. Eu e uma amiga fomos comer em Republique e, como todos os que me conhecem sabem que falo palavrão. Rolou todo o tipo de baixaria no papo. Na mesa do lado, presumo que todos fossem franceses, começaram a sair uns "a mesa do lado". Momento vergonha própria, né, porque vergonha alheia é pouco!...

PS: Bom, aproveito a deixa pra desejar a todos um Feliz Ano Novo, com muitas felicidades...

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Como alguns estrangeiros nos veem!

Bom, antes de iniciar o post preciso esclarecer duas coisinhas básicas a pedido de amigos. O primeiro esclarecimento tem a ver com a expressão c'est pas grave que significa "não foi nada", "isso não é grave" ou "relaxa, você não me incomodou". Claro que isso é uma fórmula polida de expressão e você vai entender o verdadeiro sentido dela no tom que o falante usar na hora de pronunciá-la (tudo bem linguisticamente documentado como um bom estudante de Letras). É a mesma coisa com a palavra desolée que pode de fato siginificar "sinto muito", mas que, geralmente, significa "você se fodeu e a culpa não é minha", tudo com uma politesse très très jolie. Outro esclarecimento que quero fazer é que no primeiro post eu usei a expressão "população mais filha da puta do planeta", que para mim significa "gente complicada". Pessoal, não quero denegrir a imagem dos parisienses, ok? O que aparece nos posts são impressões generalizadas e é claro que há pessoas maravilhosas nessa cidade que é linda... As postagens tem a ver mais com o choque de cultura que eu, um capiau do norte paulista, tomo com a cultura francesa/parisiense.
Todavia, para não deixar esse post chatinho vamos falar do tema "Como alguns estrangeiros veem os brazucas". Em geral, existe um amor pelo Brasil, eles realmente gostam da gente, nos acham exóticos e extrovertidos e com uma potência para o prazer que eles invejam. É que eles não conhecem certas figuras do cenário político e religioso do Brasil atual. Os franceses adoram a cultura brasileira, amam samba e tem alguns que adoram forró. Fui com uma amiga num bar chamado Bizzart, no Quai de Valmy (porto de Valmy) que tinha forró e havia um monte de franceses e francesas que adoravam dançar e dançavam muito bem!
Mas esse não é um blog de elogios, né. Então usando um pouco do doce veneno do escorpião (eu sou escorpiano) vamos mostrar três pequenos diálogos que ilustram os micos que alguns estrangeiros pagam quando falam do Brasil.  Sim, meus queridos, estrangeiros também pagam micos, alguns, na verdade, pagam King Kongs.
Os fatos aqui narrados são apenas baseados na realidade, então de uma forma bem Janete Clair eu digo que "os eventos aqui contado são ficcionais, embora possam ser vividos por qualquer pessoa real. Qualquer semelhança é mera coincidência"

1 - A menina e oca

- (PROFESSOR) Bom dia, hoje é o primeiro dia de aula e gostaria que vocês se apresentassem, por favor! Comece você, senhorita.
- (ALUNA BRASILEIRA) Bom dia, meu nome é Mariana e faço doutorado em Ciências sociais. Sou brasileira e moro em Manaus, Amazonas.
- (PROFESSOR) Genial!!! De Manaus! Agora me diga, você mora numa oca?

2 - A russa

- Escuta, é verdade que no Rio de Janeiro todos os moradores saem de sunga e de bíquini em todos os lugares? Vocês vivem de bíquini?
- (Brasileira depois de 5 minutos sem acreditar no que estava ouvindo): Sim, é a mais pura verdade!!! Eu, inclusive, quando vou ao mercado, ja saio de topless e salto alto. É muito comum isso no Brasil, muito prático, né?

3 - Moogli, o menino da floresta

- Onde você mora no Brasil? Em São Paulo? No Rio de Janeiro?
- Ah!, eu não moro em nenhuma dessas capitais. Moro no interior.
- Então, você mora na floresta? Tipo, igual à floresta amazônica?
(Brasileiro sem acreditar MESMO no que estava ouvindo): - Não, querida, minha cidade é super urbana, tem mais de 450 mil habitantes! (Mas na verdade, ele quis mesmo respoder isso): "Moro, sim, numa selva, inclusive meu vizinho é um índio que pratica antropofagia e eu tenho de tomar super cuidado com ele. Tenho um macaco de estimação que dorme comigo e quando saio para passear levo minha onça pintada na corrente!!!!"

Acho que não era preciso nem comentar mais nada, não é?!! Mas como eu não aguento, vou ter de dizer alguma coisa. Então aí vai minha reflexão: não é genial perceber como alguns europeus sabem o que se passa fora de seu pequeno e velho continente? Agora, para você brazuca, que adora pagar pau para cultura dos outros e vive falando mal de seu próprio país: estrangeiros também podem ser bafônicos e miquentos... é só saber procurar!

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

E pra comemorar um aniversário...

Hoje, excepcionalmente, vou publicar dois posts. O primeiro "Reflexões sobre amor na cidade luz" estava na minha cabeça há tempos e na boa: nem sei se ficou lá grande coisa, no entanto queria publicá-lo... Mas esse novo post vai ser publicado por dois motivos. O primeiro é que ele é um pedido do meu novo amigo Leonardo Félix (pidão, você, heim, Léo!...rs), que está fazendo aniversário hoje e o segundo, intimamente ligado ao primeiro, é que falar sobre o aniversário do Léo é um pontapé para falar de amizades, que aqui se constroem muito mais rapidamente, visto que a carência é um "trem que pega"
A gente é jogado nessa cidade toda cosmopolita e cheia de coisa para se fazer, mas no fundo, somos um grupo de solitários que, depois de encher a cara de vinho barato (e muito bom, diga-se de passagem), chega em casa e dorme sozinho, bêbado e de ressaca e cai em depressão pós-alcool. Mas somos surpreendidos constantemente e por essas coisas das vida, isso que chamamos de coincidência, de fado, de destino, de acaso - deem o nome que quiserem - faz com que encontremos pessoas que possuem a mesma vibe da gente, porque, me desculpem aqueles que não concordam comigo, mas definitivamente, em se tratando de amor e amizade, os opostos não se atraem.Fizemos, desse modo, nosso pequeno clan parisien, formado por mim, Rosangela Luft, Letícia Pontual, Sandra Garrido e Louise Rosseti, Gabriel Dalmasso, Leonardo Félix, Thiago Fraga e muitos outros que foram se aproximando por conta do amigo de um amigo que indicou a pessoa porque ela era legal.
É aí que entra Léo, marido de Sandra, amiga que conheci num dia de compras em Chatelêt (très chic, non?). Bom, como todos bons baianos (e eu sou filho de uma), Sandra e Léo são simpatícissimos e engraçados. Não sei se eles são ligados a isso, mas pra mim Léo deve ser filho de Ogum ou de Xangô por conta da expressividade, já Sandra com aquele seu jeitinho de falar deve ser filha de Oxum, que sabe o que quer e como as águas dos rios sabe contornar dificuldades. Quando eles contam as histórias de suas viagens, eu relembro aulas sobre perspectivas narrativas, porque cada um tem a sua versão da história e elas são sempre engraçadas Como todos bom brasileiros (e acho que os baianos nisso se superam) eles integram a gente no grupo, a ponto de acharmos que os conhecemos a décadas (conheço Sandra há somente dois meses e Léo há poucas semanas) e isso faz de nossa estada aqui, longe dos amigos e familiares que ficaram do outro lado do Atlântico, muita mais leve e feliz.
Então aproveito essa oportunidade para desejar a Léo, feliz aniversário e, também, brindar as amizades que fiz aqui na figura desse casal de baianos arretados e queridos. Logo mais a noite, saimos pra comemorar: como sempre álcool será um dos companheiros inseparáveis, mas a melhor companhia será, sem dúvida, a celebração da amizade: daquelas que se fizeram aqui, daquelas que são mantidas lá do outro lado do mundo, num lugar bem quente chamado Brasil.

Reflexões sobre amor na cidade luz

 A primeira coisa que as pessoas perguntam quando você está morando numa cidade como Paris é"e aí, já ficou com um francês (uma francesa)? Como é?".
Gente, vamos combinar, né, o mercado de relações afetivas está difícil em qualquer lugar do mundo e não iria ser diferente aqui em Paris. A cidade te convida a amar, afinal deve ser lindamente romântico você beijar às margens do Sena, tudo bem clichê, bem romance cor-de-rosa tipo Bárbara Cartlan ou aqueles romances Julia, Sabrina, etc, mas como diria Caetano Veloso: "a vida é real e é de viés". Então ficamos só nos quereres mesmo.
Agora, para você que está pensando em vir à Paris, achando que vai conseguir um príncipe encantado, todo europeu e cheio de charme eu tenho duas más notícias: a) os princípes só são interessantes nos contos de fada. Basta você dar uma olhadinha na história para perceber que eles são sujos, feios, desdentados e sem modos. O símbolo máximo do absolutismo francês, Louis XIV era bem onívoro, ou seja, comia qualquer coisa (se é que vocês me entendem) e consta que não era lá chegado a grandes e demorados banhos... b) os franceses são muito pragmáticos, essa é a segunda má notícia. Isso significa que essa coisinha de você enrolar o cara por várias semanas pensando "só vou dar na sétima vez" não cola aqui. Se você pretende ficar com um francês saiba: ajoelhou vai ter de rezar, a não ser se vocês tiverem um jantar e tudo e tal aí, sim, você estará fadado (fadada) a passar pelo processo de conquista que passa pela recepção de um cartão com o telefone da pessoa. Sim, acreditem, os franceses dão cartões às mulheres, esperando que elas liguem!!!
Quando perguntam a alguém se esta pessoa ja ficou com um francês, eu penso: "vixe, mal ele sabe da missa um terço". Namorar um francês, na minha interpretação, é todo um processo que vocês vão entender com essa pequena descrição/conto/sei-lá-o-o-que. E eu coloco você, leitor amigo, no lugar da minha personagem:
Bom, você entra no metrô (aqui existem linhas muito bem frequentadas, como as linhas 1, 3, 6, 9) e você se depara com um cara mega bem vestido (ele pode estar usando Armani), daí você olha e gosta, porque afinal, o cara é magro, as pernas são boas, coxões, cara bonita, mesmo careca ele mantém o seu charme e você começa a ficar empolgado, mas eis que a pessoa percebe que você está paquerando ela, então, para disfarçar, ela começa a falar ao telefone e sorri e ao sorrir você vê um tártaro de mais ou menos 15 anos!!!!... c'est pas grave... o negócio é desviar o olhar e fingir que nada aconteceu...
Entenderam a dificuldade? Espero que sim, mas há sempre pioneiros descobridores de jóias raras, de repente você é um... mas se não for também, pague o mico de olhar pro cara do metrô, seja feliz por alguns segundos e depois de ver que os dentes dele são podríssimos, você vai ter um linda decepção, mas isso tudo faz parte de seu aprendizado cultural, para você deixar de pensar que as coisas são fáceis e para você deixar de ter como slogan de vida: "eu não tenho tipo, eu tenho pressa"...

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Origem do blog "c'est pas grave"

Um dia desses, quando eu e meus amigos brasileiros nos encontramos pela primeira vez na Maison Henrich Heine, onde moro, contamos nossas aventuras e desventuras por Paris, uma cidade linda, poética, cheia de cores, propícia ao amor, culturalmente pujante, mas com a população mais filha da puta do planeta... e resolvemos, eu e Letícia Pontual, uma amiga jornalista que conheci aqui em Paris, contar pequenos trechos dessa nossa estada aqui na Ville Lumière. Pois bem, depois de alguns meses e muitos micos, eis que trago a quem quiser ler as aventuras e desventuras dos tupinambás em terras francesas (os franceses nos acham muiiito tupinambás). No mais o blog vai tratar de outras coisas que também acharmos interessantes, porque, no fim das contas, estar numa cidade como Paris é, no mínimo, um momento muito luxo, poder, riqueza e sedução na vida de qualquer criatura... então, um brinde a Paris e uma banana para os parisienses e vamos aos trabalhos....rs